Em fila indiana, os jogadores do Flamengo deixaram o vestiário do Engenhão em direção ao túnel de acesso ao gramado. Por trás do arrumado moicano de Léo Moura notava-se alguém saltitante. O cabelo voava a cada pulo. Era Ronaldinho.
A poucos metros – e alguns degraus – do encontro com os 42 mil rubro-negros que o aguardavam com um caprichado mosaico, o camisa 10 repetia em alto e bom som: “Alegria! Alegria!”.
Tentava disfarçar a ansiedade ou resumir o que esperava da noite especial de estreia? Talvez um pouco de ambos. Mas a alegria ganhou adição de emoção assim que se deparou com a festa preparada.
Dezenas de bandeiras com o rosto dele surgiram no estádio, a inscrição “Bem-vindo, R-10” surtiu o efeito desejado. Parado perto da linha lateral, esperou os companheiros chegarem quase ao centro do campo para, com o pé direito, iniciar um rápido pique. Parecia querer se jogar nos braços de quem não escondia a devoção.
- Se sentir amado é algo fora do normal, faz vencer as dificuldades. Não dá vontade de sair do campo. É algo inesquecível, algo que jamais vou esquecer. É a emoção mais forte que se pode ter. É inexplicável. Muita gente que não está sendo homenageada está emocionado. Imagina eu? Estou realizado e agora é continuar trabalhando, lutar para conquistar títulos na temporada – disse Ronaldinho, suado e emocionado após 90 minutos de uma estreia vitoriosa em todos os sentidos.
O dia de debutante dele começou quase 12 horas antes da entrevista final. Foi ao meio-dia, horário marcado pelo Flamengo para o almoço, que Ronaldinho desceu do quarto para almoçar com os companheiros.
Menos de meia hora depois, deixou o restaurante no térreo do hotel Windsor, na Barra da Tijuca, e voltou para o quarto. Não sem antes atender aos pedidos por fotografias e autógrafos.
Na nova visita ao saguão, uma cena curiosa durante mais uma rodada de atendimento aos fãs. Uma corretora de imóveis que o aguardava desde as 10h30m ofertou uma casa de R$ 3 milhões em Niterói. O principal atrativo era “chegar e sair” da mansão de barco. Paciente, Ronaldinho, que ainda mora em um hotel e busca uma casa no Recreio dos Bandeirantes, recebeu fotos e vídeos e prometeu responder.
- Está bom, te dou um retorno – disse o jogador.
Àquela altura, o camisa 10 já sabia que Vanderlei o escolhera como novo capitão. Mas se preocupou em conversar com Léo Moura e contar sobre o que acontecera. Os dois combinaram a cena que se viu no Engenhão. O camisa 2 foi ao centro do gramado, tirou a braçadeira e a colocou no braço do novo dono. A torcida reconheceu a nobreza de Léo e o aplaudiu fervorosamente.
Antes disso, ao chegar ao estádio, Ronaldinho era aguardado por fãs improváveis naquele momento. Alguns jogadores do Nova Iguaçu estavam perto do ônibus rubro-negro e um deles acenou para o astro. O gesto teve retribuição.
Ronaldinho quer retribuir o carinho. De tudo e de todos. Mas principalmente dos rubro-negros. O primeiro toque na bola não demorou. Ele dominou, ajeitou e... Errou o passe. Os torcedores gritaram como se fosse um gol perdido.
Depois dali se soltou. Errou mais algumas vezes, é verdade. Porém, também deu lindos toques de calcanhar, pedalou, cobrou faltas perigosas e não poupou a torcida de “bronca” pelo silêncio no início do segundo tempo.
Quando Wanderley fez o gol da vitória por 1 a 0, Ronaldinho correu até a pista de atletismo atrás do gol para festejar. Tentou acompanhar o companheiro. Mas o ensandecido camisa 33 o deixou para com a comemoração à la velocista de 100m rasos.
A torcida encerrou o jogo gritando o nome de Wanderley. Ronaldinho foi ao encontro para abraçá-lo. Depois, ganhou todos os holofotes. Sozinho no gramado, virou-se para as arquibancadas e iniciou os agradecimentos. Por mais de um minuto “conversou” com os rubro-negros e colocou a mão direita no braço esquerdo para dizer que estava arrepiado.
No vestiário, foi a vez de encontrar os companheiros. Um a um. Abraços, apertos de mão e uma nítida emoção por, pela primeira vez, exercer de fato e direito a frase que disse durante a apresentação oficial: “Agora eu sou Mengão”.
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