terça-feira, 1 de junho de 2010

Depois de 20 anos, Zico volta como um 'mortal': 'Ninguém faz milagre'

Foi longa a espera. Vinte anos. Mas nesta terça-feira o torcedor do Flamengo pôde voltar a comemorar com Zico. O Galinho de Quintino assumiu oficialmente a função de diretor-executivo rubro-negro e terá a missão de coordenar todas as ações do futebol do clube. Entre elas, contratações, dispensas e a reestruturação física do clube, sua prioridade.

Zico se mostrou emocionado em suas primeiras palavras como dirigente do Flamengo.

- Em termos de coração, nunca deixaria o Flamengo. Mas segui meu caminho de trabalho. Viajei muito por esse mundo afora. Conheci muitas maneiras de se trabalhar dentro e fora de campo. Ao voltar ao Brasil, o único lugar para trabalhar seria o Flamengo. Já tive de enfrentar a seleção brasileira e foi muito duro. E seria ainda mais duro enfrentar o Flamengo - disse o eterno ídolo, referindo-se aos jogos que fez contra o Brasil no comando da seleção do Japão, pela Copa das Confederações de 2005 e na Copa do Mundo de 2006.

Zico retorna no aniversário de 30 anos do primeiro título brasileiro do Mengão

A emoção do dia histórico, porém, deu lugar à razão na maior parte da festa. Zico pediu para que a torcida tente deixar de lado as cobranças de falta precisas, os dribles geniais, concentrando-se apenas no futuro como dirigente. Ele garante estar pronto para eventuais pressões no novo cargo.

- Venho de peito aberto e estou preparado. Peço que tenham confiança no trabalho que será executado. Queremos deixar um trabalho firme, sério. O nosso tempo vai passando e a gente vive de desafios. Tenho acompanhado de perto todo o processo que o Flamengo passa. Sei da responsabilidade que cabe a mim. Chegou o momento de tomar essa decisão. Milagre ninguém faz. Não tenham aquela expectativa. E posso dizer que não estava tudo errado. Ninguém ganha tanto com tudo errado. Temos que dar as melhores condições para os atletas. Os jogadores dos outros centros precisam saber o que o Flamengo pode dar a eles. Nosso primeiro objetivo é tentar terminar o Centro de Treinamento George Helal, no Recreio dos Bandeirantes (Ninho do Urubu).

No salão nobre do clube, conselheiros do Flamengo, entre eles os ex-presidentes George Helal, Gilberto Carodoso Filho e Delair Dumbrosck, se misturavam aos muitos jornalistas e rubro-negros ilustres, como Júnior, Andrade, Lazaroni, Jayme e Silva Batuta. O ex-vice presidente de futebol Marcos Braz também se fez presente. A presidente Patrícia Amorim resumiu a emoção de todos os rubro-negros.

- É com muito orgulho que apresentamos o ídolo e âncora desse clube, Arthur Antunes Coimbra, o nosso Zico. É um momento histórico, um momento único. Hoje, o Flamengo escreve mais um capítulo em sua história. Isso vai resgatar a união política necessária ao clube. O Zico é o ídolo da maior nação do país. Estamos imbuídos de ajudar esse grande profissional a fazer o Flamengo a crescer. O Flamengo dá um grande passo na sua história – discursou a presidente.

Leia a entrevista completa de Zico:

Como é assumir uma nova função tendo sido um ídolo incontestável?

O ídolo ficou para trás. Tudo que se fez, não é apagado. Mas, agora, eu começo do zero. Quero ser julgado como dirigente. No Japão, fiz um trabalho muito bonito lá. Quem teve a oportunidade de conhecer sabe. Fico muito feliz de ter dado o pontapé inicial da profissionalização lá. Aqui, já é profissional. O que eu peço é que as pessoas acreditem no trabalho que será feito. O que eu viso é o resultado final.

Você acredita que a torcida vai saber separar o ídolo do dirigente?

Se eu merecer críticas, ela tem que criticar mesmo. Como dirigente, a torcida pode cobrar. Se fizer besteira, tem que falar. Sento aqui sabendo que estou sujeito a essas críticas. O importante é o trabalho. No final do meu compromisso, a gente avalia o que deixou de bom.

Por que você não queria receber do clube?

É uma questão de opinião. Eu já recebi do Flamengo o que tinha para receber quando era jogador. Eu tenho meus recursos, através da minha imagem, de conseguir por outros meios. Não quero causar prejuízos ao clube, mas ajudar.

Quais serão os primeiros passos do Zico dirigente no Flamengo?

A gente tem montado um organograma de trabalho, onde está escrito quem fará que função no clube, do profissional ao mirim. O Flamengo tem que ter a cada ano um número x de jogadores que serão aproveitados no time principal. Quem comanda os times de base tem que saber que irá formar jogadores para o Flamengo. O objetivo não é ganhar título. Se ganhar, melhor. Mas a grande preocupação tem que ser formar atletas.

Qual é seu maior desafio nessa volta?

Manter uma equipe campeã. Hoje, o Flamengo é campeão brasileiro. Temos de lutar para formar um time em condições de defender este título. Mas é lógico que o trabalho não é só de um mês ou dois. O grande desafio é terminar o CT George Helal.

Você deve ter acompanhado os episódios de indisciplina dos jogadores neste ano. Como pretende trabalhar com isso?

Eu gosto de usar o diálogo. Mas todos os jogadores sabem que têm direitos e deveres. Quando você assina um contrato, sabe o que tem que fazer. E isso será cobrado. O jogador tem que não só entrar em campo, mas também preservar a imagem do clube. Está no contrato. Você tem que explicar aos jogadores o que você quer e sua maneira de trabalhar. Quando você olha no olho e diz o que quer, diminui o percentual de erros no futuro.

No Brasileiro, alguns jogadores tinham regalias porque davam resultado. O que pensa disso?

Não critico a maneira de trabalhar de ninguém. Mas direitos e deveres são iguais para todos. O que eu quero é o cumprimento do que for determinado pela comissão técnica.

Acha que o fato de ter sido jogador pode facilitar na relação com os atletas?


Muitas vezes, sim. Quando o atleta está na frente de uma pessoa que não passou pelo que ele passou, pode rebater. Agora, quando está de frente para uma pessoa que passou por isso e que teve sucesso, já pode pensar mais. Não quero que o jogador me olhe como ídolo. Eu quero que me olhe como um dirigente que está ali para resolver um problema daquele momento. Meu pensamento é sempre pensar pelo lado positivo. Tentar ajudar o atleta para que ele renda o melhor.

O que há de concreto em relação a contratações?

A direção não trabalha divulgando notícias. Trabalha para quando houver uma concretização passar para vocês (jornalistas). Algumas coisas, antes de eu vir para cá, já estavam sendo delineadas e eu aprovo. Eu não vou falar de nomes.

Existe alguma coisa bem encaminhada que o Flamengo pode anunciar esta semana?

Acredito que sim. É um momento de muitas ofertas. Quem se movimentar na frente vai chegar ganhando. Acho que a gente pode ter boas respostas em poucos dias.

A equipe que você quer tem algum perfil específico?

Não existe isso. Depende dos jogadores. Mas queremos um perfil vencedor.

Por ter trabalhado no CSKA, que detém os direitos do Vagner Love, acha que pode ajudar na permanência dele?


Se eu puder ajudar nessa questão do Vagner, vou ajudar. Mas está bem encaminhada pela vice-presidência.

Você disse que os treinadores tinham dificuldades para trabalhar no Brasil. Acha que consegue mudar isso no Flamengo?

O Rogério, pelo pouco período que está no comando, vem bem. Tem toda minha confiança para ser o comandante da equipe do Flamengo. O treinador tem um percentual de importância na equipe, mas, no final, quem decide são os jogadores. O elenco do Flamengo, se acreditar no potencial que tem, pode sempre buscar vitórias. Há pouco tempo, vi os maiores exemplos de humildade e de ajuda a um técnico. Os jogadores de alto nível da Inter de Milão desceram de um pedestal para ajudar. Sabiam das dificuldades, mas aceitaram as determinações que o treinador dava, se entregaram e foram campeões.

Hoje você assume como dirigente. O capítulo treinador ficou para trás?

Treinador, esquece. Não tem a menor possibilidade. Tenho contrato até o fim do mandato da Patrícia e pretendo cumpri-lo. Cheguei ao Flamengo em 67. A primeira foto que eu tirei foi ao lado do Silva, que está aqui. Cheguei cheio de sonhos. Jogar é muito mais fácil do que ser dirigente. O importante é arregaçar as mangas e ver o que pode ser feito.

Quando você assume de fato o Flamengo?

Estou viajando quinta-feira. Tenho um evento em Hong Kong, depois vou para a África do Sul para um evento da Fifa. Depois, vou para a abertura da Copa do Mundo e volto ao Brasil para começar meu trabalho. Perto da final da Copa do Mundo, vou dar uma clínica na Disney e depois volto para me dedicar 24h ao Flamengo.

Com sua imagem, acredita que pode unir as correntes políticas do clube ou acha que depende de resultados?

Quem está no futebol sabe que depende de resultados. As correntes políticas existem, mas acredito que todas querem o melhor do Flamengo. É normal que você seja cobrado. Isso faz você querer ser cada vez melhor. Mas estou acostumado a ser cobrado. Estou aqui por causa da confiança da Patrícia. Mas, se amanhã ela achar que não estou indo bem, pode decidir que eu devo sair. E isso não me deixaria chateado.

Nessa sua nova função vai caber botar chuteira, calção, e mostrar como se faz?

Tem dvd aí para quem quiser ver (risos). Quem sabe a gente não organiza um time de masters para fazer alguma festa, comemorar algum título?

O futebol deve passar todo para Vargem Grande?

Meu pensamento sempre foi de ter o futebol profissional na Gávea. Mas sei das dificuldades de criar um departamento só na Gávea. O projeto do CT é muito ambicioso. Em clubes como o Fenerbahçe, vi a diferença que isso faz. O que eu quero é um CT profissional. Esse é um dos motivos principais para você trabalhar com tranquilidade.

A Copa do Mundo está próxima, qual sua opinião sobre as chances do Brasil?

Acredito na seleção. Todo mundo sabe que o Brasil, do jeito que está, tem condições de voltar com a taça. É um time bom. Vamos torcer para que tudo dê certo.


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