A
fala mansa e o caminhar tranquilo ainda são os mesmos. Pouca coisa
mudou na vida de Jayme de Almeida desde que saiu do Flamengo, há quase
três meses. Até mesmo a mágoa pela forma como sua demissão foi anunciada
já ficou pelo caminho. De lá para cá, só uma coisa se fortaleceu com o
tempo: a vontade de trabalhar. Sem muitas chances em clubes de ponta, o
treinador de 61 anos segue em busca de uma oportunidade para fazer
aquilo que mais gosta: comandar um time de futebol.
— Se eu
tivesse recebido alguma proposta oficial, já estaria trabalhando. Houve
conversas que não foram para frente — contou ele, revelando que o papo
foi com uma equipe da Série A do Brasileirão. A vontade de retomar
sua carreira é tão grande que as rusgas do passado foram esquecidas.
Identificado com o Fla pelos quase 40 anos de casa, entre idas e vindas
(passou como técnico por Desportiva Ferroviária-ES e Iraty-PR) como
jogador e funcionário, Jayme não descarta voltar um dia, mesmo que não
tenha sido chamado para trabalhar com o amigo Luxemburgo.
— O que
passou, passou. Não tenho nada a reclamar. É um clube que me deu chances
e me colocou na vitrine. Nunca fechei uma porta na minha vida. Por onde
passei, saí pela porta da frente. Se tiver que voltar, vou entrar por
ela.
Confira outros trechos da entrevista:
Saída polêmica do Flamengo
O
que me machucou foi a forma como eu fui avisado de que estava sendo
demitido. Eu soube pela imprensa e isso me deixou chateado.
Infelizmente, a cultura do futebol brasileiro é essa, de trocar
treinadores o tempo todo. Mas faz parte. Já passou. Na minha vida, nunca
guardei mágoas de nada. Isso não leva ninguém a lugar nenhum. Tenho que
seguir meu caminho, estou feliz. Tenho orgulho do que fiz pelo clube.
Não é fácil conquistar o que conquistei. Tenho também que agradecer pela
oportunidade.
Tempo longe do futebol
Espero
que isso não me prejudique. Por tudo o que fiz e mostrei, tenho
respaldo para trabalhar em qualquer time. Mas, claro, esse tempo longe
pode, sim, de afastar do mercado. Mas, acredito no meu trabalho e tenho
certeza de que logo vou voltar a trabalhar. Não sei explicar a falta de
chances em clubes grandes. É preciso saber das pessoas que estão no
comando dessas equipes. Estou tranquilo, porque sei que o meu papel eu
cumpri. As oportunidades vão voltar a aparecer.
Preconceito com técnicos negros
Existe
da mesma forma que acontece no mercado de trabalho em qualquer lugar,
não é só no futebol. Infelizmente, por causa da cultura do nosso país. A
classe negra sempre recebeu poucas oportunidades por vir da época da
escravidão e nunca teve condições de ascender socialmente. Aos poucos,
isso está acontecendo naturalmente. Daqui a pouco, outros chegarão e vão
ganhar espaço no futebol. Só mesmo com educação para mudar isso.
Rotina e assédio da torcida
A
repercussão da minha saída do Flamengo, a minha conduta dentro e os
resultados que consegui fazem com que os torcedores me tratem com muito
carinho. Isso me deixa feliz por saber que eu fiz um grande trabalho.
Até hoje, aonde eu vou, recebo carinho do pessoal. Isso me enche de
orgulho. Faço caminhadas na praia, gosto muito de ler. Tenho levado uma
vida muito tranquila, sem agitação. E, claro, acompanho muito futebol.
Vejo todos os jogos. É o meu dever de casa.
Futebol brasileiro após a Copa
As
seleções mostraram uma postura de muito profissionalismo. No Brasil,
ainda falta um pouco isso. Lá, há muito comprometimento com o que
precisam fazer em campo. Hoje, a Alemanha tem um futebol muito mais
bonito que o nosso. A gente perdeu isso durante o tempo. Nosso futebol
está muito pesado, de força. Nunca foi assim. Perdemos a técnica. A
volta do Dunga me pegou de surpresa, eu não esperava realmente.
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