Quando
Alexandre Wrobel deixou a vice-presidência de futebol do Flamengo, no
início de junho, não foi substituído por outra pessoa, e sim pelo
chamado Conselho Gestor de Futebol. A medida praticamente eliminou as
dúvidas sobre o poder do grupo nessa área. O discurso oficial dá ao
diretor executivo Rodrigo Caetano a chancela sobre as principais
decisões, mas a realidade foge da teoria. São os integrantes do Conselho
- advogados, economistas e administradores - que têm ditado os rumos do
futebol rubro-negro.
Respaldados pelos sucessos nas finanças e a redução das dívidas, o grupo esbarra na inconsistência dos resultados no futebol. Desde 2013, foram três diretores executivos, sete treinadores e dois títulos - Copa do Brasil de 2013 e Carioca de 2014. No Brasileirão, flerte constante com a zona de rebaixamento e nenhuma aparição no G-4 em 89 rodadas de comando.
Respaldados pelos sucessos nas finanças e a redução das dívidas, o grupo esbarra na inconsistência dos resultados no futebol. Desde 2013, foram três diretores executivos, sete treinadores e dois títulos - Copa do Brasil de 2013 e Carioca de 2014. No Brasileirão, flerte constante com a zona de rebaixamento e nenhuma aparição no G-4 em 89 rodadas de comando.
Modo de atuação
De forma oficial, são sete membros: Eduardo Bandeira de Mello (presidente), Rodrigo Tostes (vice de finanças), Fred Luz (diretor geral), Rodolfo Landim (vice de planejamento), Alexandre Póvoa (vice de esportes olímpicos), Alexandre Wrobel (agora apenas membro do conselho) e Rodrigo Caetano (diretor executivo de futebol). Mas o curioso é que Rodrigo Caetano não tem WhatsApp e somente às vezes participa das reuniões.
O regime do Flamengo é presidencialista, mas as decisões em todas as áreas do clube são tomadas em colegiado, sistema anunciado desde o início do mandato de Bandeira, em 2013. Isso faz com que o voto do presidente tenha o mesmo peso do voto do vice de esportes olímpicos, por exemplo, na hora de tomar uma decisão sobre o futebol.
- O Conselho Gestor é uma coisa que existe em todas as empresas. É uma forma de você entregar as decisões estratégicas de uma empresa, no caso o futebol do Flamengo, a um conjunto de conselheiros com competência e que deixam todas as decisões operacionais a cargo do diretor executivo. É o que funciona nas grandes empresas. Por que não vai funcionar no Flamengo? O Rodrigo Caetano é o diretor executivo, e os conselheiros são os que dão conselhos, exercem uma função semelhante à de um conselho de administração numa sociedade anônima. Claro que guardadas as devidas proporções - explicou Bandeira de Mello.
Nas “devidas proporções” citadas pelo presidente apoiam-se as críticas. Em vez de um conselho formado por experts na operação da "empresa Flamengo" - no caso, o futebol -, há torcedores fanáticos de perfis diferentes, mas basicamente ligados à área financeira. Os dirigentes têm pouco conhecimento do pantanoso mercado futebolístico e precisam de ajuda para ambientar-se. O CEO Fred Luz, por exemplo, pediu ajuda ao coaching Fernando Gonçalves, ex-Traffic, para aproximar-se de alguns empresários.
A paixão provoca atitudes drásticas. Em 2013, o então vice de futebol Wallim Vasconellos, com respaldo do Conselho, demitiu Renato Abreu pelo site oficial antes de avisá-lo. A atitude gerou uma ação na Justiça e um acordo pago à vista de R$ 2,5 milhões para encerrar o processo.
A situação causa embaraço a treinadores e diretores executivos. Eles sentem-se desprotegidos e constantemente “queimados” por não terem decisões avalizadas. Um dos profissionais que já passaram pelo clube classificou a relação como “esquizofrênica”.
- Se der certo, mérito do Conselho Gestor. Se der errado, culpa do departamento de futebol - resumiu.
Braço direito do presidente, Rodrigo Tostes é quem mais tem feito a ligação entre o departamento de futebol e a diretoria. Embalado pela grande melhora do clube nas finanças, tem se fortalecido internamente a cada dia mais. Hoje ele é o mais próximo da figura de um vice-presidente da pasta. O problema é que Tostes pouco vai ao Ninho do Urubu, assim como os outros vice-presidentes. Apenas Bandeira e Fred Luz aparecem vez ou outra no centro de treinamento. E isso acabou configurando distanciamento entre o Ninho e a Gávea, sede social do clube.
A saída de Luxa
A maior polêmica entre as partes ocorreu na demissão de Vanderlei Luxemburgo, no fim de maio, quando Wrobel ainda era o vice de futebol. Na ocasião, o treinador teve a saída definida pelo Conselho Gestor de Futebol, sem a participação de Rodrigo Caetano, que só ficou sabendo da decisão ao chegar de viagem com a delegação após a derrota por 2 a 1 para o Avaí. O episódio gerou um grande mal-estar nos bastidores. Fred Luz deu a versão sobre os fatos e negou que o diretor executivo não estivesse de acordo com a demissão.
- Isso não é exatamente assim. Na verdade, todas as questões do futebol são discutidas continuamente. Então, havia discussões sobre o Vanderlei, sim, inclusive sobre a possibilidade de ele sair. Quando houve o interesse do São Paulo, ali foi uma possibilidade de o Vanderlei sair, por iniciativa dele próprio. Em qualquer lugar, você está sempre discutindo sobre as pessoas que você tem. O ideal é manter as pessoas, porque o custo de trocar é muito alto. Perde-se um tempo muito grande. Esse nosso elenco tem uma influência razoável do Vanderlei nas decisões lá atrás. Ele participou das discussões de montagem de elenco. O que a gente ainda não conseguiu foi uma estabilidade no futebol. Mas o Rodrigo se encaixa muito bem dentro desse nosso modelo, no meu ponto de vista. Não é que o Rodrigo não soubesse de nada, não tivesse insatisfação com o Vanderlei. Tinha. O que não tinha era aquela decisão do último momento para tomar. Tinha um conversa em andamento. Nada se decide do dia para a noite. Se o Rodrigo fosse radicalmente contra a saída do Vanderlei... Para tirar o técnico contra a vontade do diretor de futebol, a gente tem que tirar o diretor de futebol, né?
Bandeira de Mello e Fred Luz, na linha de frente, acompanham treino na Gávea (Foto: Cahê Mota)
Pouco tempo depois da demissão de Luxemburgo, deu-se a saída de Wrobel da vice-presidência de futebol. O Flamengo enviou nota oficial na ocasião, sem dar maiores explicações sobre o assunto. Wrobel, que deixou o cargo principalmente por problemas pessoais, até hoje não tem cargo definido no clube, apesar de ser membro do Conselho Gestor do Futebol. E ele nem pretende assumir outra pasta.
"O Clube de Regatas do Flamengo informa que a partir desta terça-feira (09/06), os trabalhos do dia a dia da vice-presidência de futebol passarão a ser exercidos diretamente pelo Conselho de Gestão do Futebol, com a liderança do presidente Eduardo Bandeira de Mello e do vice-presidente de finanças Rodrigo Tostes e a participação dos vice-presidentes Alexandre Póvoa, Rodolfo Landim e Alexandre Wrobel, além do diretor-geral do Flamengo, Fred Luz, e do diretor-executivo de futebol, Rodrigo Caetano", dizia o comunicado.
O mesmo Luxa, no fim do ano passado, ainda na gestão do ex-diretor executivo Felipe Ximenes - que fazia parte do tal grupo de WhatsApp -, teve a continuidade no cargo decidida por meio de uma apertada votação do conselho: 4 a 3 a favor da permanência. Meses depois, já na era Caetano, quando foi demitido, o treinador detonou seus gestores.
- A diretoria tem pessoas sérias, mas na relação de propostas ela é complicada. O Flamengo trabalha com grupo de gestores. Nós, eu e o Rodrigo Caetano, contratados, não somos ouvidos. O grupo resolve as coisas e não sabe nada de futebol. Podem ser competentes nas suas empresas. O Caetano fica de pés e mãos atados. Esse grupo veta tudo. Que experiência (os dirigentes) têm em futebol? Eles ganham prêmio, saem no NY Times, mas têm que ganhar prêmio no futebol, e o Flamengo é futebol.
Renovação de contrato esbarra no Conselho
Outro caso ocorrido neste ano foi a frustrada renovação contratual de Samir. Rodrigo Caetano acertou a prorrogação do vínculo do zagueiro, alvo do futebol europeu, e um aumento salarial. As partes redigiram o contrato, mas o Conselho Gestor de Futebol vetou. Caetano desgastou-se com o empresário e com o próprio jogador.
Por motivos semelhantes, Felipe Ximenes, demitido ainda em 2014 após seis meses no cargo, deixou o Flamengo bastante chateado com o Conselho. O fato é que uma simples renovação de contrato passa pelos conselheiros, apesar de já existir um orçamento pré-definido, enquanto algumas decisões são modificadas e irritam jogadores e comissão técnica. Segundo Fred Luz, as decisões do futebol não podem prejudicar outras áreas, principalmente no que se refere à parte financeira.
- O Conselho tem a missão de cuidar para que as decisões do futebol não afetem negativamente outras áreas do clube. Cuidar para que as decisões do futebol sejam consistentes com os objetivos do clube. Você não consegue separar a parte técnica da financeira. O Rodrigo faz um mapeamento do elenco buscando entender as oportunidades de melhoria. Você diminui despesas tirando atletas, e aumenta despesas trazendo outros atletas. A grosso modo, definimos um orçamento para o ano. Mas o ano vai passando, e eventualmente você tem receitas maiores ou menores do que estava prevendo, aí tem revisões de orçamento. Ele sempre sabe quanto poderá gastar se precisar reforçar o time. Agora, quando começa a discutir valores muito relevantes, tanto para compra quanto para venda, nenhuma empresa deixa essa decisão na mão de uma pessoa só. Então, tem um debate, que começa dentro do departamento de futebol. E esses assuntos normalmente são levados ao conselho de futebol. É uma forma de dividir mais, entender melhor como o futebol deseja fazer as coisas. E depois acompanhar o que está sendo feito, se os resultados estão ou não acontecendo de acordo com aquilo que foi programado - afirmou o diretor geral.
Recentemente, um flagra do GloboEsporte.com mostrou uma troca de ideias entre Alexandre Póvoa e Bandeira de Mello. Após uma mensagem em que elogiava a atitude do time na vitória contra o Internacional por 2 a 1, no Beira-Rio, o vice de esportes olímpicos questionou o presidente sobre a legalidade da cobrança de uma multa caso o acordo para a não utilização de Guerrero contra o Corinthians, no último fim de semana, fosse quebrado. Bandeira respondeu ao dirigente indagando se, mesmo que a multa fosse ilegal, valeria a pena comprar a briga, e ponderou ainda se o peruano se sentiria à vontade para jogar nessa situação. Ele afirmou ainda que o clube paulista tinha um bom argumento pelo fato de que se comprometeu a pagar o restante do contrato do jogador, que se encerraria no meio de julho. Guerrero ficou fora do jogo.
Alexandre Wrobel, Vanderlei Luxemburgo e Rodrigo Caetano (Foto: Vicente Seda)
No fim de 2013, Luiz Eduardo Baptista, o Bap, então vice de marketing e figura das mais influentes no Conselho, procurou Abel Braga e o convidou para ser treinador do Rubro-Negro sem avisar a Pelaipe. E o ex-diretor foi voto vencido na época em que o clube trouxe Jorginho para ser o técnico, em março daquele mesmo ano, uma vez que preferia Alexandre Gallo.
Por causa da irregularidade, Cristóvão Borges corre risco de ser demitido em breve. Ele conta com apoio irrestrito de Bandeira de Mello e Rodrigo Caetano, mas não é unanimidade entre os conselheiros. E, como a maioria é quem decide, o treinador pode não seguir no clube, apesar de ter a confiança das duas figuras que na teoria seriam as mais importantes do futebol rubro-negro.
Os conhecimentos financeiros e administrativos de membros do Conselho Gestor, formado em sua maioria por economistas e advogados com invejáveis currículos, de fato aliviaram muito as contas do Flamengo nos últimos anos. Mas o futebol não apresentou o mesmo resultado positivo e a torcida começa a demonstrar impaciência.
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