sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Forte pressão política marca os últimos dias de Zico no Fla

Hino do clube estourando na caixa de som, plateia chorando, Patrícia Amorim sorridente entregando a camisa 10. O dia 1º de junho de 2010 marcou a volta de Zico ao Flamengo. Era a esperança de um novo tempo, o resgate de um Flamengo histórico. O desafio era gigantesco e seria encarado por três anos. Mas o sonho durou exatos quatro meses e terminou no meio da madrugada desta sexta-feira, com as luzes da Gávea apagadas e sem ninguém para reverenciá-lo. A mensagem de despedida no site oficial postada no início desta sexta-feira é dura, mas direta e diz que o Flamengo atual morreu no coração dele.

Para a torcida, a decisão foi inesperada, surpreendente. Mas quem convivia com o Galinho notava que a alegria o abandonara há algum tempo. Ele passou as últimas semanas pensativo, tendo que dividir o tempo entre os (muitos) problemas do time profissional e a necesidade de defender-se de uma série de acusações que partiram dos corredores da Gávea e estabelereceram-se no Conselho Fiscal.

Em tão pouco tempo surgiram algumas denúncias. Envolveram os filhos dele em supostas transferências de jogadores para o Rubro-Negro e questionaram a parceria do Flamengo com o CFZ. Acusaram Zico de "terceirizar" as divisões de base para favorecer a empresa MFD, que arrendou o clube dele por dez anos.

Tudo desmentido com veemência e, segundo Zico, facilmente refutável com provas documentais. Mas ele não teve paciência para encarar tamanho desgaste. Notou que a guerra política o atrapalharia e prejudicaria ainda mais o Flamengo, um clube em que todo mundo tem voz.

Zico sofre mesmo desgaste que Júnior em 2004

Poucas horas antes de comunicar a decisão, o diretor executivo conversou com José Carlos Dias. O ex-vice de finanças foi quem arquitetou a volta dele ao Fla, e notou o ex-craque desgostoso, prestes a desistir do projeto.

- Os que deixaram o Flamengo sem talão de cheques são os mesmos que batem no Zico. Sinto vergonha do que fizeram com o Júnior em 2004 e do que fazem com o Zico agora. Querem derrubar a maior reserva moral do clube a troco de nada. Quem vai ser o próximo? - disse, em tom indiganado.

Outro ídolo da história rubro-negra, Júnior teve problemas semelhantes em 2004. Contratado por Marcio Braga para gerir profissionalmente o Fla-Futebol, ele sofreu com o boicote deliberado da ala amadora da diretoria por causa de meia dúzia de maus resultados.

O caso emblemático ocorreu na contratação do atacante Dimba, conduzida pelo vice-geral Arthur Rocha sem o consentimento do departamento de futebol. Diante do desconforto que a situação causou, Rocha não se fez de rogado e avisou que o "marujo", referindo-se a Júnior, não deveria se meter nas ordens do comandante.

Desta vez, em tom mais brando, o vice-geral Hélio Ferraz disse que haveria cobrança sobre o piloto (Zico). Era um claro sinal de que a diretoria não estava satisfeita com o trabalho. Dentro de campo o time não se encontrou. Os reforços necessários para substituir o Império do Amor - Diogo e Deivid - só chegaram no último dia da janela de transferências.

Àquela altura, o dirigente Zico tinha debitado na conta as contratações de Borja e Val Baiano e a má condução do comando da equipe. Primeiro por manter Rogério Lourenço mesmo com críticas pesadas da torcida. Depois por investir e insistir em Silas. O resultado na tabela é o 15º lugar, com 29 pontos, e a ameaça de rebaixamento.

Mas nada disso foi capaz de abalar o prestígio do ídolo com a torcida. Na internet surgiu o movimento "Com Zico Pelo Flamengo", que visava a apoiá-lo irrestritamente na tentativa de mudar o Flamengo. Nas redes sociais houve comoção instantânea assim que a notícia se espalhou. Chegaram a cogitar que ocorrera uma invasão "de um vascaíno" no site oficial de Zico. Apenas uma tentativa de amenizar a frustração por, mais uma vez, ver o sonho de um novo Flamengo naugrafar.

A política

- Pronto, a Patrícia conseguiu a blindagem que precisava.

A frase foi dita por um dos conselheiros da oposição assim que Zico aceitou o cargo de diretor-executivo do futebol rubro-negro. E foi assim nesses quatro meses. Patrícia Amorim teve um início de mandato conturbado, com mil e um problemas no futebol que terminaram com a saída do vice de futebol Marcos Braz e do técnico Andrade no meio da disputa da Taça Libertadores.

A eliminação nas quartas de final e o "abandono" por quase dois meses do departamento de futebol aumentaram a pressão. A oposição preparava ataques ferozes à Patrícia e a sensação era de que pretendiam tirá-la à força da cadeira de presidente. Mas, habilmente, a dirigente conseguiu o melhor escudo: o maior ídolo da história rubro-negra para auxiliá-la.

Só que nem Zico ficou imune aos questionamentos. E a mira voltou-se contra ele rápido demais. Patrícia chegou a dizer que ele estava "assustado" com a avalanche de questionamentos e garantiu que o bancaria. Sabia que, no fundo, ele era uma grande segurança política. Que já não existe mais e novamente colocará a capacidade dela de administrar crises à prova.


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