terça-feira, 19 de agosto de 2014

Ossos do ofício: com quatro fraturas, Cáceres não mede sacrifício pelo Flamengo


Caceres Flamengo entrevista (Foto: Alexandre Durão) O recado de Vanderlei Luxemburgo nas últimas entrevistas tem sido claro: com um elenco limitado tecnicamente, o Flamengo precisa jogar no sacrifício para escapar do rebaixamento no Brasileirão. E sacrificar é um verbo que Víctor Cáceres soube conjugar como poucos nos últimos tempos com a camisa rubro-negra. Indicado pelo próprio Luxa após se destacar no Libertad, o paraguaio reencontra o treinador justamente em seu melhor momento pelo clube, dois anos e quatro fraturas após sua contratação. Lesões que são fruto de um lema que o volante diz ter aprendido em seu país e que define bem a realidade da equipe: se faltar técnica, tem que sobrar raça.


A vitória de domingo, sobre o Coritiba, foi a primeira do Flamengo no Brasileirão sem Cáceres em campo. Nada, porém, que abale um posto que demorou para ser alcançado: de titular absoluto. Após cumprir suspensão automática contra o Coxa, o paraguaio tem retorno garantido diante do Atlético-MG, quarta-feira, no Maracanã. E em entrevista ao GloboEsporte.com no condomínio onde mora no Rio de Janeiro já deu o recado: não fugirá de divididas. Mesmo que o custo seja uma quinta fratura defendendo o clube, o volante garante: vale a pena.

- O jogador paraguaio tem isso de muita raça, disputa cada bola como se fosse a última. Não somos muito técnicos como os brasileiros. Então, cada um tem que mostrar o que tem de melhor em campo (...) Com certeza vale a pena (a fratura). É o meu trabalho, estou exposto a isso. A vontade não pode faltar nunca no futebol.

De contrato renovado automaticamente recentemente, Cáceres tem mais dois anos pela frente no Flamengo. Período em que projeta jogar bem mais do que as 54 partidas que fez até o momento e repetir a trajetória de outro paraguaio que conheceu através de histórias contadas por seu pai e por Luxemburgo, e que marcou época na Gávea: Francisco Reyes.

Confira abaixo toda entrevista de Victor Cáceres:

Depois de altos e baixos em um primeiro momento no Flamengo, você tem vivido sua melhor fase em 2014, desde a Libertadores. Acha que está próximo do Cáceres que tem tanto prestígio no Paraguai?
- Acho que estou tendo um ano bom. Nos dois primeiros anos no Flamengo, machuquei muito e não consegui ter sequência. Ainda não consegui, né? Por conta das suspensões, mas, graças a Deus, estou chegando ao nível que jogava no Libertad. Com certeza vou me dedicar mais para chegar ao nível ideal.
 
Caceres Flamengo entrevista (Foto: Alexandre Durão)
O que mudou para este crescimento?
- Acho que tem muito da questão da adaptação ao país. No começo foi difícil, até pelo idioma e estilo de jogo. Aqui é muito diferente do Paraguai. Lá é mais cadenciado, aqui é correria.

Agora, você finalmente poderá trabalhar com o Luxemburgo, que foi justamente quem te indicou para o Flamengo. Isso te deixa ainda mais confiante e tranquilo para dar sequência ao bom momento?
- Com certeza. A confiança é o mais importante para um jogador de futebol. Luxemburgo passa isso não só para mim, mas para todos os jogadores. Todo elenco está mais confiante, ele transmite isso. Por isso, o time está jogando melhor, mais encaixado.

Você ficou fora de duas partidas recentemente por suspensão, mas em momento algum teve sua condição de titular questionada, ao contrário de outras épocas. Já se sente dono da posição? Você já tem consciência da importância que passou a ter para o time, principalmente defensivamente?
- Não me sinto dono do posto, mas me sinto, sim, muito mais confiante do que me sentia. O fato de poder ter sequência é fundamental. Não me sinto muito importante para o time ainda, tenho que demonstrar isso em campo, a cada jogo.

Seu rendimento cresceu bastante principalmente durante a disputa da Libertadores. Você acha que essa característica de entrega, de dedicação do jogador sul-americano, fez a diferença ao seu favor? Com um time limitado tecnicamente, isso se torna ainda mais importante?
- O jogador paraguaio tem isso de muita raça, disputa cada bola como se fosse a última. Não somos muito técnicos como os brasileiros. Então, cada um tem que mostrar o que tem de melhor em campo. Mas sei que todos os companheiros também se entregam por completo. Não vejo tanta diferença, mas vocês (brasileiros) sempre falam sobre isso (risos). Pode ser verdade.

Acha que essa característica acaba te expondo mais fisicamente? Esse é o motivo de tanta lesão um pouco fora do comum, como as fraturas que você teve no Flamengo?
- Foram quatro fraturas: cotovelo, ombro, mão e quadril. Sempre falo com os fisioterapeutas que nunca me machuquei ao longo da carreira, e é algo que tem acontecido muito no Flamengo. Acho que é pelo sacrifício, entrega total, mudança de ritmo de treinamento...

São fraturas que valeram a pena pelo clube?
- Com certeza vale a pena. É o meu trabalho, estou exposto a isso.

Qual foi a lesão mais complicada?
- Acho que a do quadril. Joguei várias partidas com dores e demorou também para recuperação.

Essa entrega sempre foi uma característica marcante? Como foi o seu início no futebol?
- Foi como a maioria dos jogadores, com muito sacrifício. Ia andando para os treinos, jogava em um time da quarta divisão do Paraguai, até que o Libertad me comprou ainda na base. Somos oito irmãos, três que jogam futebol. Além de mim, tem um no Newell´s, da Argentina, e outro na base do Olimpia. O futebol hoje em dia é uma oportunidade de ganhar a vida, poder ajudar aos familiares... Eu pude ajudar muito. Por isso, tudo vale a pena, todo sacrifício.

Uma pessoa muito importante na sua trajetória foi o Tata Martino, que deixou o Barcelona recentemente e assumiu a seleção da Argentina. Como começou sua relação com ele? Ainda mantém contato?
- Ele foi quem me subiu para os profissionais no Libertad e é uma pessoa muito importante na minha vida. Sempre que é possível, nos falamos pelo telefone. Foi também quem me levou para seleção e tenho que agradecer muito por toda oportunidade que ele me deu.

Ainda há quem compare seu rendimento pelo Libertad e pelo Flamengo e tenha questionamentos, principalmente no posicionamento. Você mudou mesmo a maneira de jogar no Brasil ou não concorda com isso?
- Mudei, sim. Lá no Paraguai o esquema também é diferente, eu podia sair mais para atacar, revezava com meu companheiro de posição. Aqui no Brasil, o primeiro volante fica mais preso e sai muito pouco para o jogo. No Paraguai, eu conseguia jogar mais próximo do gol, mas hoje em dia gosto dessa posição. Não me arrependo, não.

Caceres Flamengo entrevista (Foto: Alexandre Durão)No Paraguai, você é muito conhecido como "Topo", que é seu apelido. Queria que você explicasse a origem? Gostaria de ser chamado assim no Brasil também?
- Não é algo que me incomode. Desde menino, meu irmão mais velho me chama assim por conta do boneco Topo Gigio, que era um rato com os dentes na frente e a orelha grande (risos). Ele falava que era parecido comigo e pegou. Os jornalistas começaram a chamar assim e ficou.

Recentemente, o Luxemburgo te comparou com o Reyes, zagueiro paraguaio que marcou época no Flamengo nas décadas de 60 e 70. Ele é uma inspiração para você? Já conhecia a história dele?
- Na verdade, não conhecia, mas meu pai fala muito. Recentemente, Luxemburgo também me lembrou da história. Fui pesquisar na internet e achei muito legal. É muito inspirador. Nós sempre sonhamos em criar identificação com o clube, virar ídolo. Ainda mais em um clube como o Flamengo.

No Libertad, você nunca tinha passado por essa situação de brigar contra o rebaixamento. Como está encarando esta realidade no Flamengo? Dá para manter a tranquilidade?
- Nunca passei por isso. Só aqui no Flamengo no ano passado, quando vivemos mais ou menos e conseguimos sair rápido. Esse ano está complicado, mas a chegada do Luxemburgo foi importante para passar tranquilidade, motivação. Com certeza vamos sair dessa situação. Estamos trabalhando forte e com dedicação. Vamos brigar por coisa melhor.

Você falou que os paraguaios têm muito essa postura de entrega por não serem tão técnicos. Diria que este é um exemplo a ser seguido por este Flamengo, que não tem conseguido demonstrar tanta qualidade com a bola nos pés e deve apostar na superação?
- A vontade não pode faltar nunca no futebol, temos que ter sempre. Contra o Botafogo e o Sport, demonstramos que queremos algo melhor. Se não estamos podendo jogar bem, temos que ganhar com raça, com vontade, com o coração.


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