'Para romper fronteiras e destacar-se na globalização do planeta bola, o futebol brasileiro precisa passar por uma transformação profunda na forma de gestão'
Sim, há camisas do Flamengo sendo vendidas em lojas de material esportivo da Europa. E o que isso significa? Parece uma bobagem, mas não é. É um fato raro quando se trata de clubes brasileiros, mesmo neste mundo globalizado em que o futebol se insere. Em tempos recentes, talvez só o Corinthians dos tempos de Ronaldo Fenômeno teve o privilégio de ver sua camisa alvinegra exposta em cabides de lojas da Nike pelo mundo. Sempre foi bem mais fácil, por mais estranho que isso passa ser, encontrar além-mar camisas do Boca e do River do que dos times brazucas.
Há uma explicação óbvia para a presença flamenguista em terras europeias: nomes como Jorge Jesus, Rafinha, Filipe Luís, Pablo Marí (agora do Arsenal) e Gabigol, conhecidos do torcedor em países como Portugal, Espanha e Itália funcionam como um cartão de visitas. A campanha do time na temporada passada, com a conquista da Libertadores e a disputa do título mundial contra o Liverpool no Qatar reforçaram o conhecimento da marca e das cores rubro-negras. Jogos foram transmitidos ao vivo para diversos países – alguns em canais de TV abertos ou acessados sem necessidade de pagamento de pay-per-view.
Toda essa movimentação, obviamente, está longe, muito longe, de representar uma conquista da Europa. Financeiramente - e mesmo em termos de marketing – é muito baixo o retorno que isso dá ao Flamengo. Ou daria a qualquer time brasileiro. No entanto, é um sinal inequívoco de que o clube está no caminho certo. E que há frutos a serem colhidos não apenas aqui, como também no exterior.
A internacionalização de suas marcas nunca foi uma prioridade dos clubes brasileiros. A gestão amadora, a visão curta da cartolagem tupiniquim nunca foi capaz de enxergar muito além do próprio nariz. Por aqui, as rivalidades provincianas, marcada pela mesquinharia e a pequenez sempre deram o tom na relação entre os clubes. Para os poucos que pensam diferente, para as cabeças mais abertas, o desafio é enorme. E mudar essa situação não depende apenas do que propõem e do que fazem na sua seara.
Para romper fronteiras e destacar-se na globalização do planeta bola, o futebol brasileiro precisa passar por uma transformação profunda na forma de gestão, no calendário, na credibilidade que desperta em investidores e na relação com o torcedor. O assunto não é novo, mas a mudança do calendário é essencial. É preciso adequar a temporada brasileira a do resto do mundo. De forma que, entre um Brasileirão e outro, nossos clubes possam excursionar, disputar torneios relevantes – muito mais do que a Florida Cup – se apresentar a mercados lucrativos como o da Ásia, um território onde hoje os europeus nadam de braçada e sem concorrência.
Mas é preciso mais. É preciso que os grandes clubes virem a chave de vez. Que um modelo empresarial de gestão se imponha. Que se perceba que a rivalidade, saudável e indispensável, deve ficar restrita aos gramados, à disputa dos campeonatos. Afinal, é isso que alimenta a paixão e faz o futebol o esporte planetário que é. Mas em temas como a gestão, a formulação do calendário, a definição do modelo das disputas e a negociação de contratos de patrocínio, de transmissão de direitos de TV decisões precisam ser tomadas em conjunto. E nesse sentido, a formação de uma liga, no modelo das ligas europeias, seria com certeza a melhor solução, libertando os clubes de vez das amarras impostas pela CBF.
Que fique claro, porém: formar uma liga não significa padronizar, nivelar ganhos e dar peso igual aos que são diferentes. Critérios objetivos devem ser respeitados: um ranking técnico, os resultados financeiros, os números de audiência. Reduzir as desigualdades deve, sim, ser um objetivo. Mas buscar o nivelamento por cima é uma obrigação - o contrário seria suicídio. Só quando isso for entendido pela cartolagem, deixando o amadorismo de lado e as divergências dentro do campo, o futebol do Brasil poderá dar um salto e se abrir para o mundo.
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