quarta-feira, 8 de abril de 2015

Após encontro, clubes decidem não aderir à MP e devem propor mudanças


Modesto Roma Júnior Santos (Foto: Bruno Giufrida)Representantes dos 20 clubes da Série A se reuniram na tarde desta quarta-feira na sede da CBF, no Rio de Janeiro, para avaliar o texto da Medida Provisória 671, e após o encontro houve um consenso: querem mudanças no texto. A MP do futebol, como ficou conhecida, foi assinada pela presidente Dilma Rousseff no último dia 19 de março e trata da renegociação das dívidas dos clubes, estimadas em quase R$ 4 bilhões.   

A CBF deve redigir um documento com as modificações propostas pela entidade e pelos cartolas e apresentá-lo à comissão mista que será formada no Congresso para a discussão da MP, que já recebeu 181 sugestões de emendas. A comissão deve ser instaurada ainda nesta semana. Vários pontos foram questionados pelos dirigentes.

O presidente do Santos, Modesto Roma Júnior cita os artigos 4º (limita os mandatos de presidentes de instituições esportivas e diz sobre a inclusão de atletas nos colegiados e votações), artigo 5º (obriga os clubes que aderirem ao programa a participarem somente de eventos organizados por entidades que estejam no PROFUT) e, principalmente, artigo 8º ( obriga a criação de uma conta centralizadora para o controle do parcelamento das dívidas).  

- Vamos exercer nossa posição para defender os pontos que entendemos que precisam ser modificados. Tem que haver modificação no artigo 4º, artigo 5º e uma profunda modificação no artigo 8º. Ninguém vai aderir da forma que está – analisou o presidente santista.  

Romildo Bolzan Jr., presidente do Grêmio, no Gre-Nal (Foto: Lucas Uebel/Grêmio, Divulgação) 
Romildo Bolzan Júnior, presidente do Grêmio: "Somente um presidente de clube muito irresponsável poderia assinar um termo desses" (Foto: Lucas Uebel/Grêmio, Divulgação)

Romildo Bolzan, mandatário máximo do Grêmio, concorda com o cartola do Peixe. O gremista chama o atual texto da MP de “intervencionista” e vai além.  

- Somente um presidente de clube muito irresponsável poderia assinar um termo desses. Esse modelo onera demais o parcelamento no começo, cria uma comissão com autoridade para intervenção e reguladora, ainda há a conta centralizada para interceder nos pagamentos, ou seja, intervém na vida administrativa dos clubes. É um mecanismo que tem vazio jurídico no sentido de tornar os clubes sem condições de competir em ligas de confederações que não possam aderir ao programa. Estamos em uma posição muito ruim, cria uma situação constrangedora – argumenta.

Alguns clubes, como o Flamengo - que nesta terça mudou seu estatuto na tentativa de ter maior responsabilidade fiscal -, são mais amenos nas críticas à MP. O presidente rubro-negro, Eduardo Bandeira de Mello, questiona apenas o artigo 8º. Os dirigentes citam o projeto de lei do deputado Otávio Leite (PSDB/RJ), que apresentou em abril do ano passado um substitutivo ao texto inicial. A proposta apresentava, dentre outros pontos, o fim da possibilidade de troca dos débitos fiscais por investimentos em esportes olímpicos e prazo de 25 anos para quitar as dívidas.   

- A ideia é criar caminho de convergência nos aspectos positivos da lei para que a medida provisória traga um texto que seja razoável e positivo para todos os lados. Os clubes estão otimistas, a CBF também e entendemos que é preciso um consenso nos interesses para que o futebol saia fortalecido nesse momento – declarou o diretor financeiro da CBF, Rogério Caboclo, em entrevista ao SporTV.

Entenda a MP

A MP do refinanciamento prevê que os clubes possam refinanciar seus débitos com a União em um prazo de 120 a 240 meses (20 anos), com o abatimento nas multas, nos juros e no encargo legal das dívidas. No caso dos que optarem por 120 meses, a previsão o desconto seja de 70% das multas, 30% dos juros e 100% sobre o valor do encargo legal. Para quem optar por 240 meses, os descontos cairiam para 60% das multas, 25% dos juros e 100% sobre o valor do encargo legal.

Nos três primeiros anos, haverá condições especiais para o pagamento das prestações. Os clubes poderão pagar parcelas mensais entre 0,16% e 0,5% do faturamento anual da instituição. Ou seja, se um clube tem um faturamento anual de R$ 100 milhões, poderá pagar durante os 36 primeiros meses uma prestação entre R$ 166 mil e R$ 500 mil. Passado este período, o restante da dívida seria parcelado em até 204 prestações iguais, completando os 240 meses.

Para aderir ao PROFUT, as entidades desportivas profissionais de futebol deverão apresentar os seguintes documentos: estatuto social e atos de designação e responsabilidade de seus gestores; demonstrações financeiras e contábeis, nos termos da legislação aplicável; e relação das operações de antecipação de receitas realizadas, assinado pelos dirigentes e pelo conselho fiscal.

Contrapartidas

Para terem acesso ao refinanciamento, porém, os clubes precisariam seguir regras de modernização da gestão esportiva. Durante a assinatura da MP, a presidente apresentou sete pontos fundamentais deverão ser cumpridos:

1) Publicação das demonstrações contábeis padronizadas, separadas por atividade econômica e por modalidade esportiva, após terem sido submetidas a auditoria independente.

2) Pagar em dia todas as obrigações tributárias, previdenciárias, trabalhistas e contratuais com atletas e demais funcionários, inclusive quanto ao direito de imagem.

3) Gastar no máximo 70% da receita bruta anual com a folha de pagamentos e direitos de imagem do futebol profissional

4) Manter investimento mínimo nas categorias de base e no futebol feminino (questão que ainda será regulamentada).

5) Não realizar antecipação ou comprometimento de receitas referentes aos próximos mandatos, a não ser em situações específicas como 30% do primeiro ano do mandato seguinte; substituição a passivos onerosos, desde que implique em redução do nível de endividamento.

6) Adotar cronograma progressivo de redução dos déficits que deverão ser completamente zerados a partir de 2021.

Rebaixamento e regras de transparência que podem atingir federações e CBF

O sétimo item das regras prevê que os clubes só poderão disputar competições organizadas por entidades de administração do desporto ou liga que siga regras de transparência. Nos moldes em que são organizados os campeonatos atualmente, a medida atingiria as federações estaduais e a CBF.

- publicação na internet de prestações de contas e demonstrações contábeis;
- representação de atletas no âmbito dos órgãos e conselhos técnicos que elaboram os regulamentos;
- autonomia do Conselho Fiscal;
- limitação de mandato de até quatro anos para os dirigentes, com apenas uma reeleição, além da inclusão de atletas nos colegiados e na eleição para os cargos.
A MP prevê ainda que os regulamentos das competições disputadas pelos clubes que aderirem ao refinanciamento tenham punições esportivas para quem descumprir as regras a partir de 2016:

- previsão no regulamento geral de competições a exigência de que todos os participantes observem as práticas de transparência e tenham regularidade fiscal atestada por meio de CND.
- previsão, a partir de 2016, no regulamento geral de competições, no mínimo, as seguintes sanções: advertência; proibição de registro de novos atletas; rebaixamento para divisão inferior.

Responsabilização de dirigentes

A medida prevê ainda a responsabilização de dirigentes que praticarem gestão temerária, inclusive, aqueles que, tendo conhecimento do ato, deixem de denunciar. Quem tiver este tipo de atitude será afastado imediatamente e ficará impossibilitado de se eleger pelo período de cinco anos. Os dirigentes poderão responder com seus próprios bens, na forma do Código Civil, por ações como:

- aplicar créditos ou bens em proveito próprio ou de terceiros;
- obter para si ou para outrem vantagem a que não faz jus e que resulte em prejuízo para a entidade desportiva;
- celebrar contrato com empresa que tenha como dirigente seu parente, até 3º grau;
- antecipar receitas de mandatos futuros, salvo nas exceções contempladas na lei;
- elevar o nível de endividamento da entidade durante o seu mandato, salvo as exceções previstas na lei;
- provocar déficit anual maior de 20% da receita bruta.

Fiscalização

Um decreto presidencial deve criar um órgão ligado ao Ministério do Esporte que ficará responsável por fiscalizar o cumprimento das regras estabelecidas pela MP. A ideia é que esse órgão conte com ampla participação de entidades ligadas ao esporte, como clubes, federações, atletas. 

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