A CBF conseguiu cassar as liminares que mantinham a Portuguesa na
primeira divisão do Campeonato Brasileiro e, nesta quinta-feira,
divulgou a tabela da competição sem o clube paulista entre os 20
participantes. Entretanto, o cenário ainda preocupa. Quem afirma é o
presidente da comissão de direito desportivo da OAB/RJ, Marcelo Jucá,
que vê a possibilidade de outras liminares serem concedidas, apesar de
não concordar com a tese dos torcedores da Lusa e do Flamengo, que
tentam recuperar os pontos perdidos no Superior Tribunal de Justiça
Desportiva (STJD), pela escalação de atletas irregulares. A decisão
rebaixou o clube paulista e livrou o Fluminense da queda para a Série B.
- Temos um cenário realmente muito preocupante. Apesar das liminares
terem sido cassadas, nenhum dos processos tem decisão definitiva e
outras liminares podem surgir com esse mesmo objeto. O que ocorre é que
após as decisões do STJD terem transitado em julgado, a partir daí foram
preenchidos os requisitos que a constituição exige para ingresso na
Justiça Comum. Aí vimos uma grande enxurrada de ações dos torcedores,
além do inquérito civil público instaurado por um promotor de São Paulo -
afirmou.
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STJD puniu Fla e Portuguesa com a perda de quatro pontos, rebaixando a Lusa (Foto: Globoesporte.com)
Para Jucá, a tese de que o Estatuto do Torcedor tem regra diferente do
Código Brasileira de Justiça Desportiva e estar hierarquicamente acima
do CBJD não pode ser considerada correta, já que o Código regula as
especificidades do esporte.
- Todas essas ações judiciais se baseiam em uma premissa de que o
Estatuto do Torcedor possui regra diferente do Código Brasileiro de
Justiça Desportiva e por ser hierarquicamente norma superior deve
prevalecer sobre a regra do Código. Na minha opinião essa premissa é
equivocada, já que o próprio Código regula as especificidades do
esporte. Um atleta punido na quinta-feira, teria sua decisão, baseada
nessa outra tese, publicada no dia seguinte, o que o prejudicaria contra
aquele julgado na sexta, que seria beneficiado, porque a decisão só
valeria a partir da segunda-feira - declarou.
Porém, o presidente da comissão de direito desportivo da OAB/RJ
considera que existem boas chances do Campeonato Brasileiro ser
paralisado.
- Dentro desse cenário com grande número de ações, podemos observar
também que poucas foram as liminares concedidas. Somente um magistrado
do estado de São Paulo tem se manifestado favorável a essa tese. E
dessas três decisões, todas foram cassadas assim como anunciou a CBF e,
em razão dessas decisões, ela pôde publicar a tabela sem a Portuguesa.
Hoje o campeonato ocorreria na forma decidida pelo STJD, mas imagine uma
liminar deferida na véspera do campeonato começar. Não teria tempo
hábil para a decisão ser cassada e o campeonato fatalmente teria que ser
paralisado mais uma vez até a liminar ser cassada. E enquanto tudo isso
está acontecendo, naquelas primeiras ações onde foram concedidas as
liminares, esse magistrado pode dar as sentenças e, pelo teor das
decisões liminares, podemos entender que a sentença seria favorável aos
torcedores. Daí mais uma vez a confusão se iniciaria - analisou.
Promotor do MP-SP dá razão aos torcedores de Lusa e Flamengo
O promotor do Ministério Público de São Paulo (MP-SP), que está
investigando o "caso Héverton", pela escalação irregular do atleta da
Lusa na última rodada do Campeonato Brasileiro, disse ser normal a
atitude da CBF de cassar as liminares, mas defendeu que o Estatuto do
Torcedor é uma lei federal e não pode ser colocado abaixo do Código
Brasileiro de Justiça Desportiva. Na opinião do promotor, o Estatuto
equipara o torcedor ao consumidor e determina que eles precisam ter
informações prévias sobre as decisões da Justiça Desportiva.
- Acredito que a CBF agiu dentro da normalidade que se esperava, afinal
de contas, entendeu que ela deveria cumprir com o que vinha
historicamente fazendo nas decisões do STJD. Com relação a esse ponto,
não me parece de forma nenhuma preocupante. O que preocupa é a maneira
pela qual a CBF adota seu procedimento para cumprimento dos artigos 34 a
36 do Estatuto do Torcedor. Entendo que se não houver valvula de
informação prévia e adequada aos torcedores, que são consumidores, os
artigos 34 a 36 ficam sem nenhum utilidade na prática. O Estatuto do
Torcedor é dirigido ao torcedor, mas, mais do que isso, integra o
torcedor ao sistema desportivo brasileliro. E ao equiparar o torcedor ao
consumidor, com direito a informação, conforme dizem os artigos 34, 35 e
36, nós temos uma integração do torcedor aos direitos básicos dele com o
Código de Defesa do Consumidor. Não há, na prática, nenhum sentido de
termos uma lei federal dispondo sobre dispositivos de Justiça Desportiva
destinados ao torcedor se esses dispositivos não forem utilizados para
te dar informação clara e prévia sobre o que a Justiça Desporitva vem
decidindo. Por conta disso é que o Ministério Público de São Paulo
entende, com máximo respeito a quem pensa no sentido contrário, que o
Estatuto do Torcedor trouxe essa novidade: a integração definitiva do
torcedor no sistema esportivo brasileiro. E, mais que isso, a garantia
de que os torcedores saberão previamente e adequadamente sobre as
decisões da Justiça Desportiva que têm que ser publicadas no sítio
eletrônico da entidade que organiza a competição - afirmou.
Roberto Senise defendeu intervenção da Justiça Comum na Justiça Desportiva (Foto: Martín Fernandez)
Senise ainda definiu a situação do Campeonato Brasileiro como uma
"crise judicial", mas mostrou-se favorável à intervenção da Justiça
Comum, garantindo que "não será instaurado um terror no futebol
brasileiro".
- Acredito que o Campeonato Brasileiro, infelizmente, passa por uma
crise judicial. Há um risco de algumas decisões judiciais virem a
confirmar a posição da CBF, outras serem contrárias, e isso comprometer o
início do Campeonato Brasileiro e seu andamento como a CBF previa. Mas
isso não significa que será instaurado um terror no futebol brasileiro. É
preciso entender isso. Existe uma teoria do terror com relação a
intervenção da Justiça Comum na Justiça Desportiva que é completamente
absurda. Não estamos acostumados no país a termos isso porque existe um
sentido de proteção da Justiça Desportiva, que deve existir, mas até um
determinado limite. E qual o limite? O limite da legalidade. E quando se
fala em legalidade, não se fala apenas no CBJD, mas também no jurídico
brasileiro. O Estatuto do Torcedor é uma lei federal. E o Código de
Defesa do Consumidor também - concluiu.
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