Na noite de terça-feira, uma reunião ordinária do Conselho Fiscal do
Flamengo constatou um grave problema na contabilidade do clube: um rombo
de R$ 7 milhões de adiantamentos sem a devida prestação de contas nas
finanças rubro-negras. O tema foi levantado na presença do contador
Rogério Tosca da Encarnação, que presta serviços e assina os balanços da
gestão de Patrícia Amorim. O órgão anunciou ter requisitado informações
sobre o montante ao Conselho Diretor no dia 19 de junho, até agora sem
resposta.
O contador não conseguiu esclarecer os questionamentos dos sócios e
conselheiros presentes sobre o rombo ou a ausência dos balancetes
financeiros trimestrais deste ano. Rogério fez um discurso duro, expondo
diversas mazelas internas da administração do clube, como transcrito
nos trechos abaixo. As declarações do contador foram retiradas da
transmissão da reunião do Conselho Fiscal realizada pelo site
"Mengonet.com.br".
Leonardo Ribeiro, o Capitão Leo, presidente do Conselho Fiscal rubro-negro
(Foto: Felippe Costa / Globoesporte.com)
(Foto: Felippe Costa / Globoesporte.com)
- As diretorias não se mobilizam e não se qualificam para tal. Esta é a
situação. Não é uma denúncia, é uma colocação. Eu me sinto capaz de
responder a qualquer um de vocês. Mas nessa colcha de retalhos que
vivemos aqui, eu me sinto incapaz de fazê-lo. Isso não é certo. (...) O
Flamengo carece de uma consciência profissional. Não existe. As
diretorias são formadas de maneira indigna. Basta ser meu amigo que eu
vou conservá-lo aqui dentro para fazer uma série de coisas - afirmou o
contador na reunião.
Em seguida, Rogério relatou as razões do buraco na contabilidade que,
de acordo com um dos presentes que se pronunciaram sem prévia
identificação, e sem ser corrigido posteriormente, já existe há 18
meses.
- Eu sou remunerado para trabalhar aqui. Lamentavelmente, me perdoem todos que estão me ouvindo aqui, é muito fácil você ver na diretoria ou quem tem a responsabilidade de responder pelo Flamengo bater no peito e dizer: 'Não ganho um tostão para estar aqui'. Não está certo isso. Deveria ser remunerado para saber o peso de uma responsabilidade. Essa gratuidade vira leviandade (aplausos). Eu sou colocado de costas e tenho de pedir desculpas a alguém que passa a mão na minha bunda, pedir desculpas por estar de costas. (...) Quero exercer a minha função e não posso fazê-lo. Presto contas de 114 empresas. Aqui só tem um problema: muito cacique e pouco índio. É o que está aqui", analisou.
- Eu sou remunerado para trabalhar aqui. Lamentavelmente, me perdoem todos que estão me ouvindo aqui, é muito fácil você ver na diretoria ou quem tem a responsabilidade de responder pelo Flamengo bater no peito e dizer: 'Não ganho um tostão para estar aqui'. Não está certo isso. Deveria ser remunerado para saber o peso de uma responsabilidade. Essa gratuidade vira leviandade (aplausos). Eu sou colocado de costas e tenho de pedir desculpas a alguém que passa a mão na minha bunda, pedir desculpas por estar de costas. (...) Quero exercer a minha função e não posso fazê-lo. Presto contas de 114 empresas. Aqui só tem um problema: muito cacique e pouco índio. É o que está aqui", analisou.
Equipe está sendo trocada e novo contador presencia desabafo
Em função de o departamento financeiro não ter emitido nenhum balancete
trimestral em 2012, o presidente do Conselho Fiscal, Leonardo Ribeiro,
informou que pediu a mudança da equipe de contabilidade. Os balancetes
são um termômetro da situação da instituição e, posteriormente, são
usados para o fechamento do balanço anual. O novo contador participou da
reunião do órgão. Ribeiro afirmou que a nova equipe de contabilidade
entra com a responsabilidade de emitir um balanço semestral
extraordinário até o fim de agosto. Na reunião de terça-feira, o ele leu
questionamentos dizendo que o "saldo de adiantamento mais do que
triplicou em 2011, passando de R$ 2,1 milhões para R$ 7,2 milhões".
O presidente em exercício do Flamengo, Hélio Ferraz, disse que soube do
ocorrido na reunião, mas não tinha como precisar o que foi dito e, por
isso, havia solicitado a gravação ao Conselho Fiscal. Ao responder por
telefone sobre os adiantamentos sem prestação de contas, Ribeiro
procurou minimizar o caso, dizendo que não há valores sem explicação.
- Não, valor que não conseguiu ser explicado não. Existem lançamentos
contábeis que estão mal classificados. Situações que são investimentos,
como por exemplo obras no Ninho do Urubu. Se pegar R$ 1 milhão para
fazer o CT, isso não é despesa, é investimento. Está classificado
errado, as notas estão erradas, a prestação de contas desse setor está
errada. Esses erros estamos correndo atrás para a coisa ficar mais
clara, o que realmente é despesa e o que é investimento - disse o
presidente do Conselho Fiscal.
Ele confirmou, contudo, o problema na reunião com o contador que está saindo do clube.
- Não conseguiu fechar os balancetes, classificar as contas, disse que
teve dificuldade de saber o que era investimento, despesa, tem obra, o
contrato todo não vai para ele, só as notas fiscais, aí não sabia se era
benfeitoria... Então deu as explicações dele lá, está certo?
Rogério Tosca da Encarnação também foi contatado pela reportagem do
GLOBOESPORTE.COM, mas afirmou que não deseja se pronunciar sobre o
assunto.
- Não me importa o que você possa escrever. Quero só que você, para bem
sintonizar o que precisa ser dito, se reporte ao Conselho Fiscal.
Porque tudo que é feito na contabilidade deságua no Conselho Fiscal e só
ele pode falar. Se ele não tem o que lhe dizer, eu também não tenho.
Respeitosamente.
Um problema, duas explicações
As justificativas do secretário-geral do Conselho Fiscal foram
diferentes das alegações da presidência do órgão. Primeiro, Júlio César
Barros negou que tivesse ocorrido algum problema na reunião do órgão.
- Não, foi feita uma apresentação pelo contador para os sócios que
questionaram. Um grupo de sócios fez um questionamento, mas o contador
foi lá e deu a justificativa para isso. Mas agora a principal questão
mesmo é que o Conselho Diretor cumpriu as exigências do Deliberativo
sobre as ressalvas nas contas de 2010.
Em seguida, insistiu que a informação estava equivocada, mas pouco depois mudou o discurso:
- Essa informação não procede. Existe um lançamento de um conselheiro
lá que teve dúvida. O conselheiro se equivocou. É um procedimento
normal. Como está na conta de adiantamentos, o conselheiro entendeu que
eram adiantamentos de pessoa física, do funcionário. Mas não é. Quando o
funcionário faz uma solicitação de empréstimo, aquilo sai na folha de
pagamento. Mas quando um supervisor de uma delegação vai viajar e ele
pega, R$ 5 mil, R$ 10 mil, R$ 30 mil, não importa, para ele viajar,
poder pagar uma emergência qualquer, também sai como adiantamento. Só
que quando ele volta da viagem, apresenta as notas fiscais para
prestação de contas. Nessa prestação de contas é que houve atraso em
alguns casos.
Indagado então se apenas alguns casos gerariam o montante milionário, Barros respondeu:
- É porque são muitas contas. Na verdade, quatro e pouco. Teve outras
coisas de adiantamento que fizeram gerar esse valor aí. Mas isso é
normal, é normal, o valor não é grande não.
Nova reunião está marcada para próxima terça-feira
Uma reunião extraordinária do Conselho Fiscal está marcada para a
próxima terça-feira e, a princípio, servirá para apresentação das
alterações feitas a pedido do Deliberativo nas contas de 2010 e
apreciação do acordo judicial para pagamento da dívida com Romário. Ele
atribuiu à desorganização financeira o recente corte dos telefones do
clube por falta de pagamento de um valor próximo a R$ 2, ressaltando a
necessidade da conclusão do balanço semestral extraordinário até o fim
de agosto.
- Urgentemente, precisamos ter noção de como está o clube. Senão
acontece o que aconteceu. O Flamengo mesmo com dinheiro não pagou a
conta de telefone. Isso é desorganização porque não tem o relatório lá
na mesa - concluiu Ribeiro.
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